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Foto do escritorPortal Saúde Agora

Com foco na comilança desenfreada, vídeos de 'Mukbang' viram exemplo de distúrbio alimentar



Em cinco anos, um youtuber engordou 100kg enquanto reunia 3 milhões de seguidores em seu canal dedicado a vídeos nos quais consome quantidades absurdas e tipos estranhos de comida. Agora obeso e famoso nas redes, o ex-vegetariano Nikocado Avocado é um dos expoentes do estilo de vídeo chamado mukbang, apontado por especialistas como exemplo de conteúdo que incentiva uma relação nada saudável com a alimentação.


O mukbang não é um fenômeno recente: esse tipo de vídeo surgiu na Coreia do Sul e o nome é uma combinação das palavras comer (muk-ja) e transmitir (bang-song). Mas agora com youtubers de diversas nacionalidades adotando esse estilo, inclusive brasileiros, os vídeos chamam a atenção para comportamentos de uma sociedade que não lida de forma equilibrada com a comida.

"Já tive pacientes com distúrbio que tinham prazer em ver vídeos de pessoas comendo porque eles mesmos não se permitiam comer", afirma Nathália Petry, nutricionista especialista em transtornos alimentares e que acompanha o fenômeno mukbang. "As pessoas gostam de entrar em contato com a comida mesmo que seja por meio da tela. Hoje nosso contato com ela é cada vez mais reduzido, seja pela correria, onde cozinhar é cada vez mais a exceção, seja pela mentalidade da dieta. Desde a infância estamos constantemente nos restringindo, cortando doces ou determinadas categorias de alimentos, o que vai nos deixando mais obcecados por comida", contextualiza Nathália.

A nutricionista avalia que os vídeos mukbang atraem por incentivar veladamente transtornos já presentes entre os que assistem. "Tem um caráter de desafio, tanto pela quantidade, quanto por fazer algo que não se deve. É o ciclo de proibição-restrição-compulsão." A entrada da brasileira youtuber Marie Flora neste universo ocorreu pouco antes do coronavírus. Quando criou o canal, em 2019, a Flora era focada na academia e só comia as refeições mais calóricas para gravar. "Quando começou a pandemia e as academias fecharam, eu passei a me alimentar muito mal e assim ficou. É ruim, mas não me faz tão mal porque já estou acostumada", avalia Marie.

Para seus mais de 21 mil seguidores ela já degustou: cachorro-quente, mandioca frita, strogonoff, moranga recheada e pão de queijo. Seus oito vídeos de maior sucesso têm um elemento em comum, o miojo. Turbinado com creme de feijão preto, costela de porco, pimenta baiana cheddar e barbecue, também conta com salgadinhos como acompanhamentos. Ainda distante do sucesso de Avocado, a brasileira teve seu maior hit de audiência com um prato gigante de miojo turbinado com pimenta baiana: mais de meio milhão de pessoas viram o vídeo feito há dois anos.

A nutricionista Nathália Petry acredita que o conteúdo produzido por Avocado ou Flora, entre outros, pode ser especialmente nocivo para os adolescentes, visto que esta é considerada uma fase de maior risco para o desenvolvimento de transtorno alimentar. No Brasil, 4,7% da população sofre de transtorno de compulsão alimentar (TCA), quase o dobro da média mundial, que gira em torno de 2,6% da população. A parcela mais afetada pelo distúrbio são jovens mulheres, com idades entre 14 e 18 anos. "Muitas pessoas com obesidade que buscam clínicas de emagrecimento poderiam ser diagnosticadas com compulsão. A grande questão é que ele é muito pouco diagnosticado porque se assume que é apenas falta de força de vontade e não buscam ajuda especializada nesse sentido ou os próprios profissionais que as acompanham não reconhecem o problema", afirma a nutricionista. Foco em comidas exóticas e humor Ainda distante do mukbang, o gaúcho Braian Rizzo, de 32 anos, se autointitula como "sommelier de comidas duvidosas" e conta que a curiosidade do público é a força motriz do interesse despertado por seus posts no Instagram sobre coisas como “cerveja em pó” ou hamburguer de pastel.

"Eu recebo muito feedback de gente que compra depois que eu mostro, mesmo quando eu falo que é ruim. A galera vai atrás para depois me dizer o que achou, também postam fotos de coisas que nunca provei e me marcam, pedindo para eu comer e dar opinião", conta Rizzo.

Ao avaliar engajamento e mukbang, Braian se diz pensativo quanto ao retorno que os youtubers dessa modalidade devem receber.

"Eu como um pouquinho para provar e mesmo assim recebo muita mensagem de gente falando que eu vou morrer ou que vou precisar de um plano de saúde muito bom. O pessoal acha que eu como miojo de chocolate o dia inteiro", revela.


Fonte: G1

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