Deputadas federais apresentaram nesta quinta-feira (24) um projeto de decreto legislativo para tornar sem efeito a nova portaria do Ministério da Saúde com regras para a realização de aborto legal em caso de estupro.
A nova edição da portaria, publicada nesta quinta-feira no "Diário Oficial da União", mantém a previsão do texto anterior, editado em agosto, de que profissionais de saúde comuniquem as autoridades policiais sobre o caso, independentemente da vontade da vítima de registrar queixa ou identificar o agressor.
No entanto, a palavra "obrigatoriedade" foi retirada do trecho sobre a comunicação à polícia. Especialistas e críticos à norma afirmam que essa denúncia sem consentimento pode expor a vítima e causar constrangimentos, além de intimidar os próprios médicos envolvidos no atendimento. O projeto de decreto legislativo é assinado por 13 parlamentares e encabeçado pela deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ). Segundo a justificativa das parlamentares, "qualquer norma que ofereça constrangimentos para o exercício de um direito deve ser prontamente contestada". "Na prática, a nova Portaria mantém o viés de inviabilizar o atendimento das mulheres e meninas vítimas de violência sexual nos serviços de saúde, ao fazer exigências que dificultam o acesso aos serviços", diz o projeto.
As deputadas afirmam, ainda, que “as mulheres vítimas de violência sexual são constantemente revitimizadas ao enfrentar o caminho para fazer valer sua opção pelo aborto legal.” Para as parlamentares, duas normas são uma "reação" ao recente caso de autorização judicial para a interrupção da gravidez de uma criança de 10 anos, estuprada pelo tio. Após a publicação da primeira portaria, Senado e Câmara também apresentaram projetos para sustá-la. Na ocasião, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), classificou a norma do Executivo como "ilegal" e "absurda".
Além de obrigar a notificação médica à polícia, a primeira versão da portaria previa que os profissionais oferecessem à vítima de estupro a visualização do feto por meio de ultrassonografia, o que foi retirado nesta nova versão. STF desmarcou julgamento A reedição foi feita um dia antes da previsão de o Supremo Tribunal Federal (STF) julgar a imposição dos profissionais da saúde em denunciar o caso à polícia, descrita em portaria editada no fim de agosto.
Nesta quinta-feira, porém, o ministro Ricardo Lewandowski, do STF, retirou de julgamento as duas ações que questionavam as regras. Na decisão, Lewandowski pediu que os autores dos processos se manifestem sobre o novo texto.
O Supremo iria julgar, no plenário virtual, a partir desta sexta-feira (25), dois processos:
uma ação de PT, PCdoB, PSB, PSOL e PDT que pedia a suspensão da norma e a garantia do direito ao aborto em caso de estupro, como assegurado pelo Código Penal;
e uma ação do Instituto Brasileiro das Organizações Sociais de Saúde (Ibross), que aponta risco de criminalização da vítima.
A professora da Universidade de Brasília (UnB) e pesquisadora em gênero, Débora Diniz, afirmou nas redes sociais que a reedição da portaria é um "jogo de palavras" e "uma chacota" com o STF. "Ministério da Saúde reeditou a portaria do aborto. Na véspera do julgamento do STF. Uma chacota com a corte pelo jogo de palavras. O dever do médico de comunicar a polícia ficou ainda pior: agora há referência legal para intimidar os médicos", publicou nas redes sociais.
Atualmente, o aborto é autorizado no Brasil em três situações: se houver risco de morte para a mulher por causa da gestação; se a gravidez foi provocada por estupro; se o feto é anencéfalo (sem cérebro). O que diz o Ministério da Saúde Em nota, o Ministério da Saúde afirmou que a portaria oferece segurança jurídica aos profissionais da saúde e que a notificação à polícia é importante para que a Justiça inicie as investigações o quanto antes.
"A normativa mantém o apoio e a segurança jurídica aos profissionais de saúde envolvidos no procedimento. O objetivo é reduzir o número de casos de violência sexual contra mulheres e crianças e apoiar as autoridades policiais na identificação dos responsáveis, garantindo a segurança e proteção de pacientes com indícios ou confirmação de abuso sexual. A partir da notificação policial, se torna possível a instauração de procedimentos que possam levar à punição rápida dos criminosos", disse a pasta em nota.
Fonte: G1
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