Ser mãe sempre foi o sonho da médica infectologista Ana Carolina Portes, 38 anos. Por seis anos, tentou engravidar, mas passou por quatro abortos espontâneos. Em 2017, ela e o marido, Bruno Augusto Portes, tomaram a decisão de tentar a inseminação artificial, mas, durante o check-up, veio o diagnóstico do câncer de mama, adiando novamente o desejo de aumentar a família.
Ana Carolina tinha 34 anos quando descobriu uma lesão do tamanho de um grão de arroz na mama direita em uma ultrassonografia mamária. Ela não esquece a data: 6 de fevereiro de 2017. “O resultado da biópsia veio positivo. Era o mesmo tipo histológico da minha mãe.”
A médica encarou a doença com muita coragem. Logo se submeteu à cirurgia de retirada da mama direita – onde o tumor foi encontrado – e da esquerda, preventivamente, para evitar a recidiva do câncer. Também realizou o teste genético Oncotype, que indica as chances de cura com tratamentos menos agressivos.
Com o risco de 11% para metástase em 15 anos (considerado baixo pelos critérios do exame), a hormonioterapia foi o tratamento escolhido para o pós-operatório. “Apesar da quimioterapia aumentar as chances de cura, não é todo mundo que precisa. Para alguns pacientes, a hormonioterapia apresenta taxas de cura acima de 99%”, explica o médico oncologista da Oncoclínicas Brasília, Cristiano Resende.
Barriga solidária
O tratamento de Ana Carolina tem duração de cinco anos, com acompanhamento a cada quatro meses. Durante este período, ela foi proibida de tentar engravidar, pois as medicações são teratogênicas – causam a má-formação fetal. No entanto, um ano depois de ter realizado a cirurgia, o desejo de ser mãe voltou a aflorar.
A médica, que tinha embriões congelados, decidiu recorrer à amiga Rafaela Gonçalves Belo, 35, para conseguir realizar o sonho de ter um filho. Rafaela foi o útero de substituição de Ana Carolina. A técnica de implantar embriões no útero de uma outra mulher é conhecida como “barriga solidária”. “Rafaela é um ser diferente, muito generosa”, descreve a médica.
Rafaela é casada com um primo de Bruno, marido de Ana Carolina. Apesar de já ter duas filhas, ela não pensou duas vezes em ajudar o casal. “Ela sempre teve o sonho de ser mãe e o fato de não poder realizá-lo mexia muito comigo. Sentia uma compaixão muito grande”, conta a amiga.
As duas sempre tiveram afinidade e se tornaram mais próximas durante a recuperação de Ana Carolina. “No meu tratamento, ela sempre esteve presente, vinha me dar banho, me ajudava, falava besteira pra me distrair”, lembra a médica.
Rafaela conta que não se surpreendeu quando a amiga lhe apresentou a ideia da gravidez por substituição. “Eu desconfiava que ela iria me pedir isso quando me chamou para conversar. O meu coração me dizia que eu estaria nesta história”. Rafaela se tornou madrinha do pequeno Samuel, hoje com um ano e 3 meses.
Na hora do parto, o menino foi direto para o colo de Ana Carolina, para que o contato pele a pele fosse imediato. “Não dava para acreditar. Eu chorava, eu ria. Nesse caminhada foram quatro abortos, foi muita espera pelo Samuel”, conta a médica, emocionada.
Histórico na família
Quando tinha 49 anos, a mãe de Carolina recebeu o diagnóstico de câncer de mama. Isso aconteceu há 20 anos e, desde então, ela, a irmã, as primas e as tias fazem acompanhamentos com exames regulares.
A mãe de Ana Carolina não resistiu ao câncer que voltou outras duas vezes com metástase e, anos depois, duas tias faleceram pelo mesmo motivo. A família da médica tem uma mutação no gene BRCA 2, mesmo tipo que motivou a atriz Angelina Jolie a retirar as duas mamas e os ovários preventivamente em 2013 para não desenvolver a doença. Carolina, entretanto, só descobriu a mutação depois de já ter desenvolvido o câncer.
O tratamento tem previsão para acabar em 2022, um mês antes de ela completar 40 anos e ela deseja ter mais um filho assim que receber a autorização dos médicos. O prazo varia de três a quatro meses após a interrupção da hormonioterapia, quando a medicação é totalmente eliminada do organismo, sem representar risco para o feto.
O oncologista Cristiano Resende destaca a importância dos médicos conversarem sobre fertilidade com as pacientes, pois muitos tratamentos de câncer podem curar a paciente, mas deixá-la infértil. “A gente tem que entender as necessidades da paciente. Para muitas, a maternidade é algo muito importante”, completa.
Fonte: Metrópoles
Comments