Em meio à discussão sobre a abertura de novos cursos de medicina no Brasil, profissionais formados fora do país ganham espaço dentro do Mais Médicos e são atualmente 39% do corpo profissional do programa. Em junho passado, os formados no exterior representavam 21%.
Mais de 9 mil intercambistas fazem parte no programa atualmente, depois que a nova lei do Mais Médicos, com flexibilização para diplomas estrangeiros, foi sancionada no ano passado. A nova lei permitiu que brasileiros e estrangeiros formados no exterior possam participar do programa Mais Médicos por quatro anos sem precisar revalidar seus diplomas, desde que tenham registro para atuar no país de formação. Após esse período, os intercambistas só poderão ser recontratados se fizerem o Revalida.
As novas regras definidas em 2023 impulsionaram o número de profissionais atualmente inscritos, que é o maior já observado na história do programa, com 25 mil médicos espalhados pelo país.
Ao ser criado em 2013, o programa contava com médicos formados fora do país que eram majoritariamente estrangeiros. Desta vez o perfil dos profissionais é diferente: na retomada do programa a maioria dos intercambistas são brasileiros que se formaram em medicina fora do país. São mais de 7 mil brasileiros nessa situação.
Esses profissionais vêm sendo usados para atender regiões afastadas. Eles são, por exemplo, a maioria (85%) entre os médicos que atuam em áreas indígenas.
Amaury de Oliveira, 41 anos, é um dos intercambistas do Mais Médicos que atua em regiões mais vulneráveis. Atualmente, trabalha no Distrito Sanitário Especial Indígena Alto Rio Solimões, no Amazonas. Segundo ele, o posto de trabalho demanda uma dedicação quase exclusiva em sua vida para garantir o atendimento aos indígenas da região.
— Nós ficamos no stand-by, como se fosse um plantão de 25 dias. Esses 25 dias eu vivo, eu moro dentro da área. Então, se alguma mulher tiver um parto meia-noite, ou aqui na comunidade, ou numa comunidade próxima, eu tenho que pegar barco e ir lá fazer o parto.
Formado em Kursk, na Rússia, o médico conta que procurou um curso fora do país pelo mesmo motivo que muitos dos intercambistas brasileiros: o preço elevado das mensalidades de faculdades particulares no Brasil. Para o futuro, o médico planeja continuar em áreas indígenas e desenvolver o seu trabalho por meio das avaliações periódicas que o Mais Médicos demanda de intercambistas.
— Em grande centro já tem bastante gente atuando, então prefiro continuar por aqui — garante.
Áreas remotas
Segundo o secretário de Atenção Primária à Saúde do Ministério da Saúde (MS), Felipe Proenço, a maioria dos médicos formados fora do país estudaram em países da América Latina, principalmente Bolívia, Paraguai e Argentina. Proenço afirma que 60% dos médicos trabalham nos municípios mais vulneráveis do país são profissionais do programa.
— Essa variedade de profissionais no programa nos permite prover médicos em áreas mais remotas, porque contamos com os médicos com registro no Brasil, mas conta também com os médicos intercambistas para essa participação importante que eles têm — afirmou o secretário.
Dados do Conselho Federal de Medicina (CFM) mostram que a taxa de médicos por habitante no Brasil é 12 vezes maior em grandes centros do que nas menores cidades. Em municípios com mais de 500 mil habitantes, a proporção é de 6,12 profissionais para cada mil habitantes. Enquanto isso, em cidades com até 5 mil pessoas, o dado é de 0,48 médicos por grupo de mil habitantes.
Procurado, o afirmou que há quantitativo suficiente de médicos no país para atender todas essas demandas internas de alocação. “A atração de médicos para essas áreas de difícil movimento e a fixação deles nesses locais não acontecem porque não existe uma política pública que tenha estímulo com foco no profissional da medicina”, disse o CFM em nota.
A lei do Mais Médicos também aumentou a periodicidade do exame do Revalida, necessário para que médicos formados no exterior obtenham o registro para exercer medicina no Brasil. O exame era realizado uma vez por semestre e agora será aplicado a cada quatro meses.
O texto prevê, ainda, que os médicos intercambistas que revalidarem seus diplomas no Brasil possam contar o tempo de atuação no Mais Médicos como prova de título de especialista em Medicina de Família e Comunidade. Esse tempo também vai valer para atender requisitos de processos seletivos, como provas de concurso público e exames de título de especialista que exijam comprovação de experiência em serviços da atenção primária à saúde.
Fonte: O Globo
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