Uma pesquisa realizada pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) com cerca de 400 médicos de 23 estados e do Distrito Federal, correspondentes a 8% do total de psiquiatras do país, mostra que 89,2% dos especialistas entrevistados destacaram o agravamento de quadros psiquiátricos em seus pacientes devido à pandemia de covid-19. “O isolamento social mexe muito com a cabeça das pessoas”, comentou, em entrevista à Agência Brasil, o presidente da ABP, Antonio Geraldo da Silva.
De acordo com o levantamento, divulgado nessa segunda-feira (11) pela associação, 47,9% dos consultados tiveram aumento nos atendimentos após o início da pandemia. Essa expansão atingiu até 25%, em comparação ao período anterior, para 59,4% dos psiquiatras entrevistados.
Do total de entrevistados, 44,6% afirmaram ter percebido queda no número de atendimentos, por razões diversas, entre as quais interrupção do tratamento pelo paciente com medo de contaminação pelo vírus, restrições de circulação impostas pelas autoridades e redução no atendimento aos grupos de risco.
A pesquisa mostra também que 67,8% dos médicos receberam pacientes novos, que nunca haviam apresentado sintomas psiquiátricos antes, após o início da pandemia e do isolamento social. Outros 69,3% relataram ter atendido pacientes que já haviam recebido alta médica, mas que tiveram recidiva de seus sintomas.
Sensibilidade
O presidente da ABP disse que a população brasileira vê o número de pessoas contaminadas pelo novo coronavírus aumentar a cada dia. “São quase 200 mil casos e mais de 11 mil mortes, e as pessoas não veem uma solução”, afirmou o especialista.
“É uma situação de medo, de ameaça constante, sem saber o que fazer”, completou. Muitos pacientes não vão ter acesso a medicamentos. Com isso, a ansiedade, o estresse e a paranoia aumentam e eles deixam de ir ao médico, perdendo as orientações necessárias.
Antonio Geraldo da Silva destacou que há 45 dias escreveu um artigo alertando o governo sobre o surgimento da “quarta onda”, que é a das doenças mentais, como resultado dos impactos que a pandemia traria nos atendimentos e na saúde mental da população.
“Não se pode descuidar das doenças de pacientes mentais e da parte da saúde mental das pessoas”, observou.
A resposta veio por intermédio da secretária de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde (SGTES), do Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro. O Ministério da Saúde firmou parceria com a ABP para garantir atendimento psiquiátrico aos profissionais do Sistema Único de Saúde (SUS) que estão na linha de frente do combate à covid-19. O Amazonas foi um dos primeiros estados atendidos.
Antonio Geraldo da Silva informou que cerca de 900 mil profissionais do SUS vão receber questionários “para saber sobre a saúde mental deles, com a preocupação do tipo cuidando do cuidador”. A ABP apoia também outra sondagem sobre a saúde mental do povo brasileiro, para identificar as doenças que vão aparecer mais neste período de pandemia.
Política pública
O presidente da ABP vai levar ao Ministério da Saúde os resultados da pesquisa com os psiquiatras, mostrando que há crescimento das doenças mentais no país. “A gente precisa fazer uma política pública mais direcionada para atender a essas pessoas que estão sofrendo. A gente precisa, com urgência, cuidar dessa quarta onda, que é a das doenças mentais, dos transtornos traumáticos. Não dá para esperar. Isso é gravíssimo”, afirmou.
O distanciamento social é a única maneira efetiva de conter o avanço rápido do coronavírus. A recomendação dos especialistas é que a medida seja seguida à risca por todos. Em especial, pelas pessoas acima de 60 anos, que fazem parte do grupo de risco. O psiquiatra Carlos Celso Serra Azul, que atua no Hospital de Saúde Mental Professor Frota Pinto (HSM), da rede pública da Secretaria da Saúde, do Governo do Ceará, afirma que os idosos devem ter uma atenção maior com a saúde mental neste período.
De acordo com o psiquiatra, alguns idosos podem desenvolver transtornos mentais, principalmente aqueles relacionados à ansiedade, estresse e depressão. “A vulnerabilidade social, a limitação da rotina e a distância dos familiares são alguns aspectos que tendem a alterar o estado emocional, afetando a saúde mental. Embora seja necessária nesse momento, a limitação da rotina do idoso pode desencadear algum transtorno”, alerta.
Para enfrentar este momento de maneira saudável, evitando problemas emocionais e psíquicos, a recomendação é que os idosos realizem o máximo de atividades dentro de casa. “Tem que ocupar o tempo e criar uma rotina com exercícios físicos, meditação, conversas por videoconferência com os familiares e com a realização de atividades que sejam prazerosas”, completa.
Além disso, é fundamental manter uma alimentação saudável e prezar por um sono reparador. Para os que usam medicação e fazem algum tipo de tratamento, a recomendação é dar continuidade às orientações médicas.
Opinião do especialista
O Portal Saúde Agora perguntou a opinião da médica Dra. Laura Campos Egidio - especialista na área da PSIQUIATRIA- e desenvolve um trabalho sobre as comorbidades que atingem psicologicamente os idosos e o papel da família. Confira a opinião da especialista:
Portal Saúde Agora: Como reconhecer que o idoso está com um quadro de depressão ou ansiedade?
Dra. Laura Campos: Normalmente os idosos ficam insones, prostrados, com redução ou aumento incomum de apetite; há também variações de humor, em que eles podem demonstrar irritação e sensação de desesperança, além de um sentimento de menos-valia.
Também é comum queixas acerca de sintomas somáticos, com dores difusas no corpo, dificuldade de concentração, lapsos de memória e dificuldade em reter informações. Há também a ocorrência de falta de ar e palpitações.
Então, basicamente, é aquele idoso que apresenta oscilações de humor, dores, falas depressivas, choro, e até podem ir ao pronto-socorro achando que estão infartando, quando na verdade é um quadro de crise de ansiedade.
Portal Saúde Agora: Que tipo de atendimento a família deve procurar para o idoso? Psiquiátrico ou psicológico?
Dra. Laura Campos: É sempre interessante buscar um acompanhamento psicoterápico com um psicólogo, mas também é sempre importante o acompanhamento com um psiquiatra, para que se possa verificar a necessidade da utilização de algum medicamento que possa ajudar.
Também é importante tomar medidas com relação ao estilo de vida do idoso: buscar alguma atividade que ele goste de fazer ou tenha interesse, como natação, caminhada, pilates, ou outras atividades que envolvam interação – como brincar com os netos, por exemplo.
Portal Saúde Agora: Qual a forma mais segura de atendimento para preservar a saúde mental do idoso durante a pandemia?
Dra. Laura Campos: Neste período de pandemia, a melhor opção de atendimento para o idoso, para evitar riscos ao sair de casa, é através da telemedicina. Também é importante afastar o idoso das notícias alarmistas em demasia, para evitar estresse e preocupação constantes.
Portal Saúde Agora: Como a família pode abordar o tema da ansiedade e depressão com o idoso? De que forma os familiares podem ajudar?
Dra. Laura Campos: É sugerido aos familiares não diminuírem ou invalidarem o sofrimento do paciente, menosprezando o que ele está sentindo. Além disso, deve-se ter cuidado e atenção, demonstrando carinho e afeto, sem deixá-lo de lado.
Demonstrar atenção é importante, e quando for necessário falar sobre a situação pandêmica, sempre seguir com cautela e atenção, sempre abertos e sem diminuir o sofrimento.
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