Ter um plano de saúde é a principal reivindicação dos mais de 160 mil servidores públicos do Governo do Distrito Federal, segundo pesquisa realizada pela Secretaria de Economia. Há 13 anos, desde a criação do Instituto de Assistência à Saúde do Servidor (Inas), o governo tenta implementar a medida, que finalmente deve sair do papel até abril de 2020.
Em entrevista à Agência Brasília, o presidente do Inas, Ricardo Peres, fala sobre os planos do governo para cuidar da saúde do servidor. Segundo ele, será publicado, neste mês, o edital de licitação para contratação da empresa que auxiliará na gestão da caixa de assistência. “É o pontapé de que precisávamos para viabilizar o plano. Se tudo correr bem, até o início de dezembro estaremos assinando o contrato, e, em abril, os servidores poderão utilizar os serviços”, prevê.
Peres afirma que a intenção inicial é atender todos os servidores, efetivos e comissionados, no modelo da autogestão com coparticipação. Os valores, ele garante, serão de 30% a 40% abaixo dos praticados no mercado.
Quando e com qual objetivo o GDF criou o Inas?
O Inas foi criado em 2006, ainda no governo [Joaquim] Roriz, já com a intenção de implementar um plano de autogestão da saúde pública. Mas, infelizmente, não foi feito naquele momento. Em 2009, o governo [José Roberto] Arruda transformou o Inas em uma administradora de planos de saúde. Ou seja, eles queriam, naquele momento, contratar uma operadora para prestar toda a assistência. No entanto, no final de 2018, o governo [Rodrigo] Rollemberg, com o mesmo entendimento, lançou um edital para contratar uma administradora para trazer operadoras do mercado para prestar o serviço. Quando o governador Ibaneis Rocha me convidou para fazer parte do instituto, já tínhamos a convicção de que era necessário fazer mudanças. Usamos a nossa experiência na OAB [Ordem dos Advogados do Brasil], quando fui presidente da Caixa de Assistência aos Advogados, e vimos que precisávamos fazer algumas modificações nesse formato, principalmente para baratear o plano.
Quais seriam essas mudanças?
Com a experiência da OAB, quando transformamos as caixas de assistência regionais em administradoras, vimos uma série de vantagens. A melhor delas, sem sombra de dúvida, é o fato de o plano ficar bem mais barato. Por isto, precisávamos ter uma administradora própria. Ou ainda melhor, uma operadora. Assim, o nosso preço seria bem diferenciado. Para confirmar isso, buscamos no mercado operadoras que possibilitariam esse processo. Tivemos um encontro com a Geap [operadora de saúde do funcionalismo federal] e observamos um modelo de negócio interessante, algo próximo do que estávamos buscando, mas não havia muito sentido em contratar uma operadora se a gente poderia ter a nossa própria. Então, o governador Ibaneis determinou que a gente criasse uma operadora exclusiva para atender o servidor do DF. Desde então, estamos estruturando um modelo de negócio voltado à autogestão para criarmos uma operadora que seja um patrimônio para o servidor público do DF.
O foco está no custo mínimo para o servidor?
Isso. Verificamos todas as possibilidades que há no mercado e chegamos à conclusão de que o melhor modelo era um que atendesse às necessidades dos servidores a um custo mais acessível. Pensando assim, o modelo da autogestão é o que melhor atende. Não pagaremos imposto, não teremos taxa de administração, não vamos visar lucro, ou seja, no mínimo, ficará de 30% a 40% mais barato que no mercado.
O Inas já tem ideia de como será feito o cálculo das mensalidades do plano?
Não. É preciso antes fazer o estudo atuarial [estatístico], mas é importante que saibam que o governo está preocupado em não onerar a vida do servidor. A ideia é fazer um plano em coparticipação até para que possamos dividir responsabilidades, para que todos possam usar com cautela em caso de necessidade. Inclusive, com base no que já é praticado no mercado, o servidor deve pagar em torno de 20% para uma consulta e 30% em caso de exames – é o que acreditamos. Serão valores possíveis de quitar, e não é nosso objetivo endividar o servidor. Estamos pensando inclusive em encontrar alternativas para tratamentos mais complexos, como os que necessitam de internação em UTI [Unidade de Terapia Intensiva]. Vimos um caso muito interessante no STJ [Superior Tribunal de Justiça] em que fizeram um seguro para essas situações. Isso significa que vamos estabelecer um teto máximo que o servidor pode pagar e tudo será parcelado no contracheque; excedendo esse valor, vai para a seguradora.
Como esse modelo se aproxima do praticado pela Geap?
Parece na forma de coparticipação, por exemplo, mas o nosso será mais barato. Veja que a Geap precisa registrar o plano na ANS [Agência Nacional de Saúde]; nós, não, porque, no nosso caso, a gestão é 100% pública. Ou seja, não precisamos fazer o registro, nem o depósito pra ANS, e isso, mais uma vez, vai refletir no preço final. É um modelo de negócio diferente daquele que normalmente é praticado no mercado. Quem tem isso hoje? O STF [Supremo Tribunal Federal], o TRF [Tribunal Regional Federal], o TJDFT [Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios] e o TST [Tribunal Superior do Trabalho].
Há uma previsão para que o plano de saúde dos servidores do GDF saia do papel?
A primeira fase foi entender como seria o formato. A segunda, definir o plano de negócios. E a terceira fase é a de criar o edital para contratar a empresa de apoio logístico, aquisição de softwares, serviços estatísticos e tudo que é necessário para auxiliar na gestão do plano. O edital está pronto, já passou pela Procuradoria-Geral do DF e, agora, está na Secretaria de Economia para ser licitado. Deve ser publicado nos próximos dias. A licitação dessa empresa é o pontapé de que precisávamos para viabilizar o plano. Se tudo correr bem, até o início de dezembro, estaremos assinando o contrato, e em abril os servidores poderão utilizar os serviços. Não só eles, como também seus familiares.
O plano inicia contemplando todos os servidores e seus dependentes?
Nossa proposta é iniciar com o atendimento a todos os servidores, sejam eles da saúde, segurança, educação ou do administrativo. Todos, inclusive os comissionados. Não será um plano de saúde compulsório, como está na lei. Entendemos que a adesão deve ser opcional. Isso porque queremos deixar o servidor bem livre para escolher. Alguns já têm um plano, não querem se desfazer dele; outros não têm interesse na adesão. Não vamos impor nada. Por isso, devemos encaminhar à Câmara Legislativa do Distrito Federal [CLDF] esse ajuste. Só não fizemos ainda esse encaminhamento porque estamos aguardando o cálculo atuarial [que utiliza as ciências atuariais – probabilidade, matemática, estatística, finanças, economia, computação], que vai dizer o quanto poderemos cobrar, qual será a demanda num primeiro momento, quanto deve ser a coparticipação para os procedimentos, quanto vamos pagar por uma consulta na rede para os prestadores de serviço e se vamos cobrar as mensalidades por faixa etária ou por base na remuneração.
O aposentado, inativo ou militar da reserva também entrarão no plano?
Esse é um dos pontos mais importantes para nós. É nessa fase que o servidor mais precisa do plano de saúde. Quando estávamos elaborando o projeto da OAB, vimos a dificuldade de vários advogados com mais idade em conseguir aderir a um plano de saúde, principalmente depois dos 65 anos. O nosso não será assim. Estamos pensando muito nesse público. Queremos recebê-los [aposentado, inativo ou militar da reserva] muito bem e, principalmente, pensar no valor da contribuição.
Os planos de saúde no Brasil, a exemplo da Cassi, passam por dificuldades financeiras por falta de um planejamento de sustentabilidade. O GDF está se preparando para garantir que os servidores tenham um plano de saúde sustentável?
A própria coparticipação já é um caminho que ajuda bastante na questão da sustentabilidade. O importante é ter rede enxuta, não de especialidades, porque temos que garantir todas, mas enxuta no sentido de valorizar os parceiros locais. Vamos focar em busca de preços diferenciados, um valor que seja bom para os fornecedores e também para nós. Outra coisa é a tecnologia. Vamos investir pesado em inteligência artificial, auditorias, para que possamos controlar todo o plano. Também estamos pensando em contratar pacotes fechados de serviços como cesarianas, porque, assim, teremos maior controle dos custos e não teremos surpresas. Ou seja, uma cesárea vai ser aquele valor determinado, tendo a paciente complicações ou não. Isso é uma proteção para que a gente não fique encarecendo o plano. Outra coisa seria uma verticalização no atendimento. Como não temos experiência em administrar um hospital, a gente pensa em fazer essa verticalização utilizando o serviço de terceiros. Poderíamos ter o hospital do servidor, administrado pela iniciativa privada, com preço diferenciado para cada procedimento e serviço, um valor mais baixo do que cobraria o mercado. Outra situação é a regionalização. Nosso plano será apenas dentro do DF. Fora daqui, faríamos convênios para atendimento emergencial. São ideias que podem ajudar a melhorar a prestação de serviço, assegurando o preço e mantendo a sustentabilidade do plano.
O senhor falou em atender o servidor e a família do servidor. A proposta inicial é de ampliar esse atendimento até qual grau de parentesco?
Na legislação de criação do Inas consta o atendimento ao servidor, cônjuge e dependentes até 21 anos. Se os filhos ainda estiverem na universidade, a idade vai até os 24 anos. Esse modelo deve ser o mesmo que vamos adotar num primeiro momento. Mas, nas várias visitas e reuniões que estão sendo realizadas com servidores, nos sindicatos e secretarias, temos percebido uma preocupação especial com os pais desses funcionários. A gente escuta muito: “Não sou casado, não tenho filhos, mas a minha preocupação é o meu pai ou a minha mãe”. Por isto, estamos estudando a possibilidade de estender isso, num segundo momento, para outros familiares dependentes – mas, claro, com valores diferenciados, até para não impactar a sustentabilidade do plano.
Há previsão orçamentária para o plano em 2020?
Sim, o orçamento está garantido. Vamos usar os recursos destinados à saúde do servidor – verba que, para 2020, está em torno de R$ 300 milhões –, somando os valores arrecadados por meio das mensalidades. Como a rede credenciada só começaremos a pagar em 90 dias, também conseguiríamos fazer uma reserva. Nossa previsão inicial é atender 160 mil servidores, [número] que, incluindo os dependentes, chega a um universo de 450 mil beneficiários. Será o maior plano de saúde do Distrito Federal.
Uma grande preocupação hoje, de quem adere a um plano de saúde, é a rede credenciada. Como garantir que o servidor seja bem-atendido?
A gente tem uma preocupação muito grande em relação a isso também. Inclusive queremos dar garantias de que o atendimento seja diluído por todas as regiões administrativas, com oferta de todas as especialidades. Vamos trabalhar por isso, com certeza.
Além do plano de saúde, o Inas planeja alguma outra ação voltada ao cuidado com a saúde do servidor?
Neste momento estamos concentrando todos os nossos esforços para implementar o plano de saúde, mas temos a intenção de fazer vários programas voltados à prevenção. O índice de afastamento dos servidores é muito alto, principalmente por questões de doenças mentais. Em 2017, 57.280 servidores se afastaram. Em 2018, foram 70.584. Se você verificar quantos foram os dias não trabalhados, só em 2018, são mais de 1,144 milhão. É algo assustador, e vamos trabalhar para diminuir esses números. Vamos organizar premiações para estimular o hábito de exames preventivos, a prática de atividades físicas, caminhadas, corridas e passeios ciclísticos. Queremos organizar também ações voltadas para a terceira idade, para incluir os aposentados nesse estilo de vida mais saudável, porque o plano de saúde tem que ser como seguro de um automóvel: a gente contribui para não ter de usar, apenas na necessidade. Por isso, as ações preventivas são tão importantes.
Fonte: Agência Brasília
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