A desnutrição é comum entre pacientes com câncer de todas as idades, mas os idosos têm mais risco de apresentar este quadro, segundo um novo estudo.
O estudo analisou cerca de 5.000 pacientes internados com vários tipos de câncer.
Foram encontradas taxas mais altas de desnutrição entre pacientes com câncer acima de 65 anos em comparação com os mais jovens. Foi observado um aumento dos sintomas relacionados com a desnutrição, como perda do apetite, em pacientes acima de 50 anos.
“Esses resultados destacam a necessidade de avaliação e triagem nutricionais, tanto para aspectos da desnutrição como para fatores de risco subjacentes, logo após a internação, a fim de iniciar intervenções precoces multi ou interdisciplinares”, afirmaram os autores.
O primeiro autor, Dr. Nivaldo de Pinho, Ph.D., do Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA), no Rio de Janeiro, enfatizou que, ao identificar os sintomas a tempo, os médicos podem impedir o avanço da desnutrição.
“Muitas dessas ocorrências podem ser minimizadas com orientação nutricional e suporte nutricional oral”, disse o Dr. Nivaldo ao Medscape.
“A orientação diz ao paciente o que fazer para prevenir e tratar esses sinais e sintomas, e o suporte nutricional corrige o déficit calórico e proteico”, disse ele.
Muitas vezes são necessárias intervenções precoces e especializadas de nutricionistas, e as evidências reforçam a provável necessidade de adotar diferentes esquemas de tratamento, de acordo com o tipo de câncer, disse o Dr. Nivaldo.
“Alguns tipos de tumores exigem acompanhamentos mais extensos durante e após o tratamento”, disse ele.
“Quimioterapia, radioterapia e cirurgia digestiva e de cabeça e pescoço causam mais prevalência de sinais e sintomas com impacto nutricional, que debilitarão ainda mais esses pacientes”, acrescentou.
Problema onipresente, porém negligenciado
O problema foi enfatizado por oncologistas norte-americanos em um artigo recém-publicado no periódico Journal of Oncology Practice. Neste artigo, os autores descreveram a desnutrição em pacientes com câncer como “o elefante branco na sala de estar”.
“É incompreensível que a perda ponderal grave de pacientes com câncer seja ignorada ou vista como inevitável”, escreveram o Dr. Declan Walsh, médico do Departamento de Oncologia de Apoio do Levine Cancer Institute, nos Estados Unidos, e colaboradores.
“A desnutrição em pacientes com câncer é um problema onipresente, porém negligenciado, que deveria – mas não é – ser tratado como prioridade estratégica no tratamento do câncer”, comentaram.
Pesquisa com quase 5.000 pacientes
Os novos resultados são provenientes do Inquérito Brasileiro de Nutrição Oncológica (iBno), que analisou 4.783 pacientes com câncer a partir de 20 anos de idade, que foram internados em 45 hospitais brasileiros entre agosto e novembro de 2012. A média de idade dos pacientes foi de 56,7 anos; mais da metade (52,4%) eram mulheres. Cabe destacar que entre os pacientes a partir de 65 anos, 57,1% eram homens e, entre pacientes com 50 anos ou menos, 64,1% eram mulheres.
Avaliações do estado e do risco nutricional dos pacientes e dos sintomas que afetam a nutrição foram feitas durante as primeiras 24 horas de internação, usando a Avaliação Global Subjetiva Gerada pelo Paciente (PG-SGA, sigla do inglês, Patient-Generated Subjective Global Assessment).
A taxa geral de desnutrição foi de 45,3%; isso incluiu desnutrição em estágio B (moderada/suspeita) e em estágio C (grave).
A prevalência de desnutrição foi maior entre os pacientes a partir de 65 anos (55%). Esta taxa foi significativamente maior do que entre os pacientes com 50 anos ou menos (36,1%) e os pacientes de 54 a 64 anos (48,4%) (P < 0,001).
Desnutrição grave foi diagnosticada em 14,6% dos pacientes a partir de 65 anos e em 12,5% dos pacientes de 51 a 64 anos.
Em relação à prevalência de sintomas que afetam a nutrição, os autores descobriram que, em comparação com aqueles com 50 anos ou menos, os pacientes a partir de 65 anos apresentaram taxas significativamente mais altas de falta de apetite (razão de risco ou odds ratio, OR, de 1,90) e boca seca (OR = 1,40; ambos P < 0,05).
Em comparação com os pacientes com 50 anos ou menos, os de 51 a 64 anos apresentaram taxas significativamente mais altas de falta de apetite (OR = 1,45), boca seca (OR = 1,22) e problemas de deglutição (OR = 1,56; P < 0,05 para todos).
“Embora quase um quarto dos pacientes na faixa etária mais baixa (≤ 50 anos) tenha relatado falta de apetite, mais de um terço da faixa etária mais alta (≥ 65 anos) apresentou este sintoma de impacto nutricional”, segundo os autores.
A prevalência dos sintomas varia de acordo com o tipo de câncer
A prevalência da falta de apetite variou de 21,8% a 44,6%, dependendo do tipo de câncer. As maiores taxas de perda de apetite foram observadas entre os pacientes com câncer de pulmão (OR = 2,88; P < 0,001), enquanto náuseas foram mais prevalentes entre os pacientes com câncer ginecológico (de 11,6% a 27,9%; OR = 2,13; P < 0,001).
Entre os pacientes com câncer do trato digestivo superior, as maiores taxas foram de vômitos (OR = 3,07) e boca seca (OR = 1,69; ambos P < 0,001).
Como era de se esperar, as taxas de problemas de deglutição foram mais altas (40,2%) entre os pacientes com câncer de cabeça e pescoço (OR = 11,59; P < 0,001).
Incentivo a avaliação com PG-SGA
Para diagnosticar desnutrição em pacientes com câncer, os autores defenderam o uso do PG-SGA.
“Embora várias ferramentas tenham sido usadas para avaliar o estado e o risco nutricional dos pacientes com câncer, o PG-SGA não apenas foi o instrumento mais usado, mas, junto com a Avaliação Global Subjetiva e a Avaliação Mini-Nutricional, está entre os poucos que cobrem todos os domínios da desnutrição, e é recomendado pela European Society for Clinical Nutrition and Metabolism“, segundo os autores.
É importante ressaltar que o PG-SGA cobre o maior número de sintomas de impacto nutricional, e que podem ser considerados fatores de risco de desnutrição.
“A identificação das causas dos problemas com a alimentação (usando o box 3 do questionário PG-SGA) pode facilitar a prevenção e/ou o tratamento precoce destes problemas, o que, no final, pode ajudar a prevenir a desnutrição ou, pelo menos, impedir que os sintomas piorem”, afirmaram os autores.
O estudo não recebeu financiamento. A coautora do estudo Dra. Harriet Jager-Wittenaar foi co-desenvolvedora da ferramenta Web/app Pt-Global baseada no PG-SGA. O Dr. Nivaldo de Pinho e os demais autores informaram não ter conflitos de interesses relevantes.
Fonte: Medscape
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